Leia a coluna da semana (26/05/2025):
Bebês Reborn — O que a psicanálise tem a dizer sobre eles?
Por Juliana Ramiro
Assim como uma virose do momento, vem se espalhando a onda dos bebês reborn. Mas afinal, o que são? Bonecos, como aqueles com que muitas crianças (principalmente meninas) brincaram na infância — porém com traços hiper-realistas. Numa rápida passada de olhos, é possível acreditar que se está diante de um bebê de verdade, com carne, osso (e psiquismo).
Originalmente, os reborns apareceram em contextos terapêuticos: em tratamentos paliativos com idosos com Alzheimer, por exemplo, para os quais a presença de um “bebê” ativa lembranças ligadas à maternidade. Também já foram utilizados com mulheres que enfrentaram perdas devastadoras, casos em que o luto por um filho levou a quadros psicóticos. Nesses contextos, o reborn entra como um suporte simbólico, uma forma provisória de acolhimento até que se possa lidar com a dor de outra forma.
Mas hoje vivemos uma febre. Há canais no YouTube com milhões de visualizações em vídeos de trocas de fraldas, mamadeiras e passeios. Psicólogos, psicanalistas e leigos olham com julgamento: “isso não é afeto, é fuga”; “as mulheres estão infantilizadas”; “falta coragem para lidar com o afeto real”.
Neste texto, proponho três caminhos de reflexão.
O primeiro: por que mulheres adultas brincando de bonecas incomodam tanto? E mais do que homens jogando videogame, colecionando carrinhos ou bonecos de super-heróis? Por que seguimos exigindo que as mulheres cresçam, amadureçam, deixem no passado seus mundos internos — mas seguimos aceitando os escapes masculinos como legítimos?
O segundo: pode haver fuga, sim. Pode haver infantilização, frustração mal elaborada e dificuldade de lidar com a realidade. Mas e daí? Qual o dano coletivo disso? Uma mulher que escolhe brincar de reborn não está impondo isso a ninguém. E por mais que a espécie humana precise das mulheres para se manter, isso não nos dá o direito de opinar sobre seus corpos, desejos ou brincadeiras.
O terceiro (e, para mim, o mais importante): Guy Debord, em A Sociedade do Espetáculo, nos lembra que vivemos uma era em que a vida se dá por meio de imagens, aparências e representações. Maternar, muitas vezes, virou espetáculo. Uma exposição constante de fotos, frases de efeito, perfeição construída para curtidas. Mas o bebê real — aquele de verdade — precisa de presença psíquica, de afeto silencioso, de rotina, de frustração e acolhimento.
E talvez seja mais honesto (e saudável para a mulher, o bebê, e nossa espécie) brincar com um boneco reborn do que parir e brincar com um bebê real como se ele fosse uma extensão do próprio ego.
Toda mulher precisa maternar? Não. E toda mulher também não precisa estar disponível psiquicamente para isso. Se não estiver — tudo bem não maternar.
O reborn não é o problema. O problema é não escutar, não respeitar, não refletir.
Nesta semana, te convido a assistir ao episódio do Psi por Aí que converso com a psicanalista e arteterapeuta Sabrina Sironi sobre a importância do cuidado na constituição do sujeito, respondendo a pergunta: o que um bebê precisa para se desenvolver?
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Texto publicado originalmente no Litoral na Rede: https://litoralnarede.com.br/tag/saudemental/
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